5 dicas para escutar mais e melhor

Considerava-me um bom ouvinte até que, um dia, percebi que isso não era verdade. Quando realmente aprendi a escutar, enxerguei o mundo e os outros de forma diferente, tudo se simplificou.

1ª – Escutar é uma lição de humildade

Se fizermos um exercício simples, ou seja, interrompermos a conversa e tentarmos lembrar as palavras e ideias exatas que outro expressou nos últimos um ou dois minutos, veremos que não resta muita coisa. As neurociências demostram hoje que nossa memória de curto prazo é limitada a alguns segundos; não passa, sequer, de um minuto. Também sabemos que, escutamos e lembramos proporcionalmente às emoções provocadas pelas palavras do outro. O que permanece é aquilo que passa pelos filtros emocionais, resultado das nossas experiências, educação e, sobretudo, dos vieses psicológicos; não necessariamente aquilo que era o mais importante para o nosso interlocutor. Além disso, muitas vezes alguma expressão específica do outro provoca emoções tão fortes em nós que nos torna temporariamente surdos.

Pior ainda, as neurociências e a psicologia concordam hoje que nossa mente mente para nós e reescreve a realidade de forma enviesada de acordo com nossos filtros. Ou seja, do pouco que, por sorte, escutamos, uma parte ainda é reescrita de forma inconsciente.

Se isso ainda não fosse suficiente, o fato é que a riqueza da informação provoca uma pobreza de atenção. Nosso cérebro e nossa escuta foram programados ao longo de milhões de anos para nossa sobrevivência, para discernir perigo e oportunidade e não para lidar com um mundo digital e exponencial, onde a quantidade de informação duplica a cada dois anos. Estamos em um momento ímpar da História, em que o ritmo da evolução biológica não consegue mais acompanhar o desenvolvimento cultural, a tal ponto que a UNESCO afirma existir um declínio empático provocado pelo excesso de informações.

“Entre o que eu penso, o que quero dizer, o que digo e o que você ouve[…], o que você quer ouvir e o que você acha que entendeu, há um abismo.” A. Jodorowsky

Moral da história: Enquanto não temos a humildade e a vulnerabilidade de aceitar que nossa capacidade de escuta é limitada, não iremos desenvolver estratégias para escutar mais e melhor.

 2ª – Escutar é uma suspensão temporária do ego. “Estamos tão cheios de nós mesmos que não temos espaço para a história do outro”

Aceita essa limitação, a questão é como lidar com ela. Gosto de usar a analogia das gavetas. De acordo com G.Miller (1954), temos entre cinco e nove gavetas para lidar com as informações de curto prazo. Uma vez cheias, o cérebro descarta as informações, o que me lembra a afirmação: “entra por um ouvido e sai pelo outro”.

O problema acontece quando as gavetas já estão tão cheias (muitas vezes de nós mesmos), que não há espaço para acolher a história do outro. Estamos tão preocupados com nossa resposta, nosso argumento, nossa opinião, com o julgamento do outro a nosso respeito, em gostar ou não gostar, concordar ou não concordar, repletos de nossas angústias, preocupações, objetivos e vontades, que, de fato, não resta muito espaço para escutar genuinamente a história do outro.

Escutar é uma decisão, a de suspender temporariamente o ego para focar a atenção no outro, sem julgamento, acolhendo as palavras dele como o são, de fato. Se ele pensa diferente de nós, é porque deve ter uma história, legítima, que ainda não conhecemos. Quem sabe a conversa consciente, desde que sejamos capazes de transformar o conflito potencial em diálogo e negociação, não seja uma oportunidade de evolução de ambas as partes?

 Moral da história: Escutar é, antes de tudo, esvaziar nossas gavetas e acolher empaticamente a história do outro, ao invés de sobrepor a sua, mesmo sem concordar, conjugando empatia e assertividade.

3ª – Inspirar antes de falar

Escutar é um exercício de presença, de atenção e está intimamente relacionado à respiração. Assim, é fundamental inspirar antes de falar, para finalizar o ciclo da escuta. Entre muitos, eis aqui alguns motivos:

  • É sempre melhor começar a falar com o pulmão cheio;
  • inspirar leva a respostas inspiradas e mostra,
  • como o raciocínio é mais lento que as emoções, enquanto o nosso corpo já sente e quer alguma coisa, o tempo da inspiração permite, à nossa mente, fazer o upload;
  • A inspiração é a chave para sair do modo automático/reptiliano/competitivo e entrar no empático/cooperativo*;
  • para o outro, que estamos processando as palavras dele.

Moral da história: Como afirma o médico psiquiatra austríaco, Viktor Frankl: “Entre o estímulo e a resposta existe um espaço. Nesse espaço, reside nosso poder de escolha. E da nossa resposta depende o nosso crescimento e liberdade”.

*Clique neste link para ler o artigo completo:

 4ª – Escutar o outro é escutar a si mesmo

Em um mundo onde nunca tivemos tantas oportunidades de nos expor, o paradoxo é que a atenção e a escuta tornaram-se raras e, portanto, preciosas. Nossa atenção transformou-se em um bem econômico e alvo, inclusive, das multinacionais. Não são apenas os familiares, amigos e colegas de trabalho que procuram nossa atenção; publicitários, mídias sociais, políticos a disputam.

Nesse contexto, quem dá prova de escuta (e, consequentemente, de atenção), pode ser comparado àquele que, vivendo em terra de cegos, possui um olho. Isso porque ao fazer com que o outro se sinta escutado leva vantagem provocando conexão e conforto e ainda respondendo a uma carência estrutural do ser humano: sentir empatia.

“As pessoas esquecerão o que você diz […], mas, dificilmente, como você as fez sentir.” Carl. W. Buehner

Agora como dar prova de escuta? Minha experiência mostrou-me que, ao iniciarmos uma resposta utilizando as palavras exatas empregadas pelo outro, criamos um rapport, uma conexão, bem mais eficiente do que ao reproduzirmos os gestos do interlocutor. Além disso, a prova da escuta acontece quando somos capazes de verbalizar o que as palavras do outro provocaram em nós, como nos lembra o especialista em comunicação, Philippe de Lapoyade.

Moral da história: Escutar o outro é escutar a si mesmo porque a prova de atenção acontece quando verbalizamos de forma assertiva, acolhedora e com inteligência emocional, o que as palavras do outro provocaram em nós.

5ª – Externalizar a memória

Já que nossa “configuração de fábrica” não está preparada para escutar tantas informações, não nos resta outra alternativa, a não ser externalizar a memória de curto prazo. Admito que seja muito útil utilizar o celular para gravar uma palestra ou uma aula, mas o mesmo não ocorre quando queremos construir uma negociação ou um diálogo, porque, nesses casos, a prova da escuta deve ocorrer em tempo real, sem a interrupção da conversa e, para isso, até hoje não achei melhor maneira do que anotar. O papel e a caneta são, a meu ver, os melhores aliados da escuta, a tal ponto que, muitas vezes, interrompi reuniões, porque não dispunha de algum deles.

Entretanto, sem conhecer as técnicas, o risco é grande de anotar aquilo de que não nos esqueceremos ou ainda de ficar com receio de perder a atenção do outro e a conexão visual.

Moral da história: Aperfeiçoe suas técnicas de anotações*, separando as ideias do outro, com discernimento, sem interpretação, anotando inclusive suas próprias ideias para não interromper a fala do outro e esvaziar as suas próprias gavetas.

*Saiba mais sobre o seminário de escutatória.

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